A paisagem do final do inverno caía no cais. No pôr-do-sol, Victória vivia uma rotina de verso e prosa onde encontravam no infinito as suas melhores composições.  As nuvens acinzentadas mesclavam-se com o azul do céu, o alaranjado do sol e o branco das outras nuvens pareciam terem sido bordadas por mãos de rendeiras.

Era inverno no litoral. Dias de ventos e chuvas fortes. Tardes de belos pores-do-sol. E ela ficava a beira do cais à espera de algo novo, carregava nos olhos a alegria dos seus momentos vividos e também os dias que não vivera. Esperava ouvir o que ainda não ouvira, ansiava em saber que pode sentir o que há muito era uma espera, por vezes, enigmática…

Em alguns momentos assumia as cores do arco-íris, mas logo o céu tornava-se cerrado e tudo voltava a cobrir-se em preto e branco. Tudo parecia inconstante, talvez mera culpa da estação incerta do litoral, que nos dias de inverno também se fazia calor.

Victória não entendia essas incertezas da natureza, que ao mesmo tempo eram suas dúvidas envoltas em seus momentos. Dias intimistas… Não se sabe até quando ela conseguirá viver nessa ambivalência.  Nem em que tempo poderá conseguir traduzir por palavras o que há muito o seu olhar já diz…

Um dia quem sabe, os seus medos ocultos deixarão de assumir o espaço da sua espera e Victória começará a conhecer o seu mundo… A entrada para ela há muito tempo que está sempre à vista…

*As palavras foram chegando junto com a lua enquanto o sol descia pelo horizonte. Apenas palavras, não momentos vividos.