Alma e papel

“Me assusta e acalma
ser portadora de várias almas
de um só som comum eco
ser reverberante espelho,
semelhante ser a boca ser a dona da palavra
sem dono de tanto dono que tem”.

[Elisa Lucinda]

Imagem: google

Há um mar de rosas que tem cheiro de poesia escrita na chuva. Há versos que são meras imagens de um poema que mais ninguém, além de nós, consegue ler… Há também, escritos presos em vielas e avenidas, um mar de águas poéticas que brincam de ondas sentimentais. Sussurros mudos, suspiros descompassados, céu, chuva, sol, lágrimas, dores, cantos, becos e bocas se escondendo na timidez dos versos. E sem conseguir um alívio de vida, a alma grita ecoando pela derme o sentimento evaporado pelos poros.

Não me chame de poeta, pois eu não entendo uma palavra escrita na rima da sedução. Nunca pensei que eu fosse escrever versos fáceis, mas também não consigo imaginar o meu eu sem as letras amarradas nos dedos. Partilho pequenos nadas que tanto dizem do que eu realmente sou; entretanto, cheguei a conclusão que esse emaranhado versar é uma mistura de letras que se agarram no final do dia tentando encurtar longas histórias de mim, porém são poucos que entenderão essas letras. Vou sendo essa que recebe as tais palavras que brincam escorregando pela mente e que trava os lábios mudos nas pontas dos dedos.

Reafirmo: não sou poeta, sinto apenas versos brincando dentro de mim, rasgando as minhas lágrimas e partindo em outras emoções. Sinto a poesia em sua forma abstrata e finjo ter sensações que ecoam num rabisco profundo da alma. Talvez um dia, quem sabe, eu tenha que reformular todas as rasuras feitas em muros e nas imagens que deixei em telas que revelam a minha paixão mútua pelas letras editadas no meio do caminho.

Há poesia em meio à dor e entre escombros de saudade. Há versos que penso serem projetos editados em vida, mas descobri que todas as minhas palavras são pequenos nós feitos em corda. Meus versos são tempos solitários parecidos com esses nós, e que sendo só não é mais que uma perfeita conjugação de milhões de outros pequenos fios. As minhas palavras são meras repetições feitas ao nada e sinto até que essas imagens nasceram na sensibilidade de uma criança que caminha pela terra deserta e, quando brindada pela chuva, faz do seu corpo a tela perfeita e a lama são os detalhes em tinta que escreve sensíveis verdades…

Brinco com as metáforas, mas não as entendo. Invento notas. Recrio olhares. Há poesia no inverso das gotas de chuva que caem dos olhos.

Desejo não ter fragmentos tão confusos, mas não sou poeta, por isso as letras se atrapalham dentro do papel. E se eu pudesse, agora, escrever qualquer metáfora deixaria registrado que o pulsar das minhas artérias não é sangue e sim poesia que escorre pelas veias carregando vida até o coração. Queria ter palavras belas, mas não sou poeta, sou mais um alguém que gosta de poesia e é isso que deixo rasgado aqui entre a alma e o papel…