E-pifanias – Cap. 22
Por Lunna Guedes
A manhã estava florescendo pela cidade quando Rayssa com seus olhos cor de madrugada adentrou a cozinha onde encontrou Anne e sua bagunça matinal: bandeja, jarro com suco, torradas, queijo, geléia. Tudo aquilo era mais uma tentativa de agradar Alexandra que ainda estava dormindo e na certa seria surpreendida por aquele gesto carinhoso.
Anne que cantarolava uma canção, silenciou-se e inventou um sorriso para receber Rayssa com um saboroso comprimento.
_ Bom dia.
Mas Rayssa que só pensava em preparar sua iguaria matinal, devolveu o “bom dia” de maneira breve sem dar margens para maiores diálogos; ignorando completamente os movimentos de Anne que continuava se dedicando de forma efusivas a organização de sua bandeja.
_ Você aceita algumas torradas.
_ Não. Obrigada.
Anne respirou fundo. Tentou esquecer da presença de Rayssa ali naquela cozinha, mas não conseguiu se conter por muito tempo.
_ Sabe de uma coisa? Eu adoraria saber porque você não gosta de mim.
Só houve espaço para um sorriso que parecia reprovar aquele comentário. Rayssa respirou fundo, voltando-se para Anne com seu olhar sombrio, comumente indiferente.
_ Eu não me lembro de ter dito a você ou a qualquer outra pessoa que seja, que eu não gosto de você…
_ Mas é tão fácil perceber isso. Você é tão transparente menina. É quase possível enxergar através de você…
Rayssa repetiu para si mesma “transparente” como se tomasse nota daquela informação. Seu olhar parecia se voltar para dentro de si mesma. Dois passos adiante e lá estava ela junto de Anne. Tal proximidade tornou possível sentir o perfume que compunha aquela figura. Uma pequena confusão. Havia algo dela e algo de Alexandra também.
_ Você já pensou que talvez seja você quem não gosta de mim e não o contrário? – um sorriso maroto se prolongou por aqueles olhos cor de manhã recém inventada junto a paisagem que teve seu silêncio interrompido pelo som do micro-ondas. O cappuccino estava pronto e já era possível voltar a vida normal, longe dos devaneios daquela mulher que as vezes jogava fora sua idade, alcançando facilmente a imaturidade de uma menina de quinze anos ou menos.
_ Você está completamente enganada ao meu respeito Rayssa.
_ Tem uma coisa que você deve saber ao meu respeito: eu nunca me engano a respeito de nada.
_ O bom da juventude é que a gente sempre acha que sabe de tudo. Mas o problema menina, é que nessa idade a gente não sabe de nada…
_ Sabe de uma coisa que eu de fato sei? O silêncio é completamente necessário para que a gente não se passe por tolo. Agora se me der licença, eu tenho um par de meias pra escolher… Tenha um bom dia.
Anne que não tinha entendido boa parte daqueles dizeres, balançou a cabeça de um lado para o outro e por fim deu de ombros para tudo aquilo. Estava feliz e satisfeita com seu reencontro com Alexandra e não iria ser aquela garota petulante que iria alterar o seu humor.
Passava das nove da manhã quando Anne e Alexandra saíram do quarto em meio a sorrisos vários e frases interrompidas por beijos e olhares desatentos ao resto do mundo até que a presença de Rayssa e sua mala pronta atravessou o caminho das duas.
_ Que mala é essa?
_ Eu vou pegar a estrada com destino a uma cidadezinha chamada Socorro.
_ Mas agora? Assim? De repente? Por que? – o incomodo gerado por aquela novidade era visível, afinal, era como se Rayssa estivesse inventando aquela viagem apenas para se afastar daquele situação.
_ Bem, meus personagens vivem numa cidade da qual eu sei o nome e mais meia dúzia de coisas. Isso não me basta. Eu preciso conhecer as ruas por onde ela transita. Preciso ver as pessoas e conhecer suas reações. Me hospedar no mesmo hotel que ela. Frequentar as mesmas paisagens. Degustar os mesmos sabores. Coisas simples mas que fazem falta no momento. Eu preciso de um casarão antigo, abandonado que tenha muitas histórias guardadas em suas paredes, portas e janelas. Também preciso de uma fazenda com uma paisagem bucólica… Eu não consigo esse tipo de coisa daqui. Você sabe muito bem que as minhas ilusões precisam ser muito bem alimentadas com o real.
A notícia fez Anne sorrir por dentro, em silêncio; mas deixou Alexandra incomodada, era a segunda vez que se sentia assim por causa de Rayssa. A primeira foi quando sua mãe havia dito que não queria mais a sua amiga em sua casa. Ela nunca teria conseguido dizer isso a Rayssa, mas não foi preciso. A sensação que abraçou sua pele naquele tempo, estava presente novamente.
_ Você vai demorar por lá?
_ Como saber?
_ Você sempre sabe…
Rayssa se abriu em sorrisos e por fim buscou por um abraço que demorou tempo bastante para causar incomodo em Anne que tentou disfarçar seu descontentamento para com aquela “cena amável” que se repetiu uma vez mais na garagem alguns minutos mais tarde.
_ Eu vou ligar pra você todos os dias.
_ Eu sei. E também vai passar dezenas de e-mails e vai olhar sua caixa de entrada de dez em dez minutos pra saber se eu já respondi. Vai querer saber todos os detalhes da viagem, da cidade e vai querer ler todas as linhas que eu escrever. Tudo bem. Minha mãe já disse tudo isso antes de você.
Alexandra desenhou um sorriso gostoso nos lábios, buscou novamente por aquele abraço no qual ela havia aprendido a ficar, demorando-se um tempo a mais e por fim segurou firme as mãos da amiga.
_ Só tem uma coisa em mim sobre a qual não paira nenhum tipo de dúvida.
_ Eu sei. Agora me deixa ir ou vamos ficar nós duas aqui chorando feito duas crianças que não sabem dizer adeus. Eu admiro isso nas crianças. Elas só gostam de dizer tchau porque adeus é tempo demais…
_ Eu vou sentir saudades.
_ Minha mãe disse isso também.
_ Claro que disse. Na próxima viagem eu vou com você. Quero acompanhar de perto essa sua aventura.
_ Está bem. Tenha lindos dias Alex e não se esqueça de desenhar sua felicidade e quando o fizer…
_ Cole na janela na primeira hora do dia…
_ Combina com chuva, com sol…
_ E com lua!
_ Você tem futuro, sabia?
O sorriso das duas coloriu aquele cenário incolor que viu Rayssa adentrar em seu carro e seguir pelos caminhos de sempre. Houve tempo para um último aceno de mãos que fez Alexandra sorrir, embora parte de sua pele exibisse uma visível frustração para com aquela viagem que se estenderia por mais de intermináveis trinta dias…
>>> Continua…
Próximo capítulo: segunda-feira, 07/02/2011
Alex
Cheguei primeiro hoje. Finalmente.
Fala sério. Quem deveria pegar um carro e ir embora era a chata da Anne. Que horror. Mas a cena foi cheia de ternura. Aposto que agora a Anne vai ficar toda boazinha. urgh. Lá vamos nós aturar a casquinha de sorvete murcha. Tchau Suzana.
Suzana Martins
Oie Aleeeeeeeeeeexx…..
Olha, confesso que da vontade de dar na cara dessa Anne. Ô casquinha jaca essa, hein?!! PQP!!
Tá, mas tudo bem…
Ou melhor tudo bem nada, porque essa história da Rayssa sair de cena, não deu pra engolir.
Vamos ver no que vai dar… rsrs
Beeijos Alex, Beijos Lu
Marco
Eu jurava que tinha comentado esse capitulo. Desatenção minha. Enfim,essa Rayssa me lembra alguem que eu conheço. Gostei.
Quero mais
Bjs
Clara
Lunna,
Parabéns pelo excelente "desenvolver" dessa história!
Beijos!
Tatiana Kielberman
Lunna, querida!
Ansiosa aqui pelos próximos desfechos…
Personagens cada vez mais únicos e envolventes!!
Beijocas!