Delírios de outono

Eu não sei precisar quando comecei a colecionar folhas. Sei apenas que elas chamam a minha atenção quando estão deitadas em alguma rua-asfalto-paisagem. Por mais que eu tente, não sei narrar quando – pelo meu caminho – esses detalhes cheios de nervuras, largados no chão, despertou o meu contentamento.

Acredito que contemplar árvores transformou-me em uma observadora e colecionadora de folhas esquecidas.

É! Acho que foi isso.

… ou aconteceu no mesmo instante que passei a colecionar letras?

A bem da verdade é que cada folha esquecida numa calçada ou no meio da rua deserta, preserva detalhes inimagináveis. A anatomia de cada uma delas nos convida a atravessar ruas inteiras, entre ventos e despedidas, só para carregar um pedacinho daquele chão numa página de caderno ou dentro do livro preferido.

Gosto de pensar que quando salvo uma folha das intempéries ou após incontáveis temporais, levo parte daquele universo para ser lido e sentido em futuros inigualáveis.

É sempre o mesmo ritual: a folha me encontra. Fotografo. Resgato. Contemplo suas nuances, coloco dentro do bloco de notas ou de algum livro e deixo-a ali, esquecida… imersa em uma história que será lembrada quando abrir aquelas páginas. É o tipo de narrativa que não precisa de uma única palavra para ser viva.

Adoro quando elas moram em algum livro-caderno-lar.

Memória de uma caminhada ao entardecer. Lembrança daquela cidade que ficou para trás. Uma rua-aconchego que seus pés não caminham mais. Uma folha que chegou imersa numa missiva. E tantas outras memórias que olhos fechados, um sorriso leve no rosto e uma xícara de chá resgatam.

Folhas esquecidas dentro do livro mesclam enredos e perfumam canções que o verbo não conjuga e reinventa memórias escritas no poema.

Cada folha imersa em minhas letras é um registro das travessias que pulsam em meus beirais.

Suzana Martins

SEVEN… sete folhas encontradas pelo caminho

Um desafio que surgiu no primeiro entardecer de Maio. Um delírio conjuto com Lunna Guedes.