Por um momento eu não entendi o porquê de você aparecer ali, por mais que eu pensasse em você diariamente, eu não estava esperando por aquela visita. Eu sabia que tínhamos que conversar, mas não àquela hora, não naquele momento. Eu tentei adiar ao máximo a nossa conversa, mas aquele dia parece que você estava determinado a colocar todos os pingos nos “is”. Eu não tinha escolha, não adiantava mais fugir, aquele era o momento certo… Você simplesmente olhou dentro dos meus olhos e começou a falar compulsivamente:
– Acho que precisamos resolver a nossa situação… Não podemos ficar nesse vai e vem, não temos que agir como se fôssemos dois estranhos, você me conhece e sabe que gosto das coisas claras, mesmo que às vezes demonstro o contrário, mas procuro ser justo em todas as situações. Estamos praticamente há dois anos juntos, e quando eu te conheci você era uma garota cheia de planos e de sonhos, com um sorriso lindo no rosto disposta a tudo, mas parece que alguma coisa mudou. Você sempre mostrou ser tão disposta e determinada que abandonou um alguém para poder vivermos o nosso caso de amor, tão destemida que deixou de lado o seu grande sonho para poder ficar comigo. E agora você fica nesse joguinho todo, por quê? Eu sei que não sou perfeito (e como tenho defeitos), mas eu tento sempre mostrar o que tenho de melhor… mas parece que de uns tempos para cá você não consegue mais enxergar isso. Eu sou sempre o injusto, o incompreensível, o enrolado, e tantos outros adjetivos pejorativos que me descreves. Talvez eu te entenda, não está dando certo, não estamos nos entendendo, então vamos resolver logo isso, cada um vai para o seu lado e pronto! Sem embolações, você não acha?!
E depois de ouvir tudo aquilo, o silêncio tomou conta daquele lugar…
Você dissera tudo o que lhe incomodava, porém as minhas palavras não saiam… E quando eu te olhei, vi que os seus olhos estavam tristes e decepcionados comigo, naquele momento eu fiquei tão confusa, tão assustada, que emudeci. Eu não estava preparada para aquele tipo de conversa, e também, não estava a fim de falar de coisas sérias e nem estava certa sobre as minhas decisões… Eu sabia que você tinha razão, havia algum tempo que eu vinha lhe evitando, o nosso amor não era mais ardente e fascinante, não corríamos mais riscos, não tinha mais o brilho do nosso primeiro encontro. E por um momento todas as boas recordações vieram à mente: a maneira louca como nos conhecemos, de como nos apaixonamos… Conversávamos horas e horas quando nos encontrávamos, e você me contava suas vitórias, suas conquistas, suas derrotas, sua vontade de fazer justiça, tudo. Era um diálogo maravilhoso, uma leitura constante… Num encontro casual, nos apaixonamos, larguei tudo e fui ficar contigo. Vivemos um ano e meio de amor incondicional, falávamos bem um do outro, estávamos sempre juntos nos amando e sendo felizes… Mas de repente um sonho esquecido bateu a porta e eu não consegui me controlar, comecei a ver em você todos os defeitos do mundo e há quase seis meses que estamos em pé de guerra…
Então por todos esses momentos, eu olhei gentilmente em seus olhos, sentindo toda emoção e poesia dos nossos preciosos dias, segurando suas trêmulas e geladas mãos, sorri e disse:
– Foi muito bom ter encontrado você, confesso que aprendi muita coisa e até revi alguns valores, mas realmente não dá mais. Todo aquele encanto do primeiro encontro não existe, aquela ideologia de mudar o mundo, você deixou para trás… E acho que seremos muito melhores como amigos, do que como amantes, porque daqui a alguns anos eu não quero que você leve a culpa por eu ter deixado meus sonhos para traz. Não quero ser injusta contigo, pois não foi isso que eu aprendi. Foi bom enquanto durou, enquanto sonhamos… Era maravilhoso ficar horas e horas acordada estudando a constituição, os códigos, as leis… mas infelizmente não dá mais! Eu preciso ir em busca dos meus sonhos, que ainda estão meio confusos, mas são sonhos e eu não posso abandoná-los! A verdade é que eu saio forçada com você, eu não quero mais te abraçar, você me cansa, seu cheiro me repudia (e olha que eu amava o cheiro que saiam de suas páginas). Sempre que vou ao seu encontro tenho que me fantasiar e ser uma pessoa que eu não sou, você me manipula e me prende. Eu gosto de liberdade, de roupas leves, de sol, do ar… Mas você tem me privado de tudo isso, e sinceramente não dá mais para continuar. Contudo, não precisa se preocupar, eu agüento mais alguns dias, não vou te deixar sozinho nessa. Mas essa nossa conversa foi um ponto final, você tem todo o direito de recorrer, mas não sei se volto, está bem?! E eu precisava ser sincera com você, porém não queria machucá-lo, mas também não quero que fiquem mágoas entre a gente, pois nossa história foi bonita enquanto durou. Os meus sonhos me chamam, e você não faz mais parte dele…
E depois de todo aquele diálogo o silêncio continuou…
E contrastando com todo aquele silêncio o céu mostrava-se ainda mais colorido, a brisa soprava de uma maneira tão acolhedora que eu me senti abraçada pela noite, a música tocava de uma forma dançante, que amenizava todo aquele clima tenso… E nós saímos dali de mãos dadas e acreditando que a felicidade estava muito mais perto do que imaginamos, e com uma certeza: as nossas diferenças haviam sido resolvidas, e quem sabe um dia, nos reencontraríamos?! E fomos de encontro a liberdade e aos sonhos que não podem ser esquecidos…

*Texto escrito na faculdade depois de tomar a difícil decisão de abandonar o curso de Direito e seguir em busca dos meus sonhos…