Amélias e Genis
Num passado distante, as mulheres já foram musas inspiradas das mais lindas canções dos poetas apaixonados. Num passado recente, Chico Buarque conseguiu traduzir a alma feminina de uma forma que muitos consideram sem igual. Lamentavelmente, a mesma mulher (?) cantada em versos e prosas com delicadeza, deferência e até devoção é hoje retratada na música popular brasileira como um descartável objeto sexual, uma verdadeira Geni – feita para apanhar e boa de cuspir.
Nessa missão de rebaixar a mulher à condição de objeto do desejo e da satisfação sexual dos machos da espécie, os hits do axé music e o chamado forró eletrônico (ou elétrico) são campeões; as letras dos sucessos entoados por multidões reforçam uma representação submissa ou vulgarizada da mulher, representações que, em um país machista como o nosso, servem para intensificar o preconceito e a desigualdade de gênero.
No caso específico do forró, a representação negativa da mulher pode ser percebida sem que seja preciso ouvir uma música sequer; a prática de depredar a figura feminina tem início logo no nome das bandas. E de Garota Safada, Menina Assanhada, Moleca Sem-Vergonha em diante vê-se a qualidade dos produtos culturais que são consumidos em massa e os valores que tais produtos repassam a seus consumidores que, certamente, os absorvem sem fazer qualquer relação entre a forma como vêem a mulher e a representação dela feita nos produtos culturais e midiáticos.
O agravante para a total falta de respeito sofrida diariamente pelas mulheres nas letras dos forrós ditos modernos é a complacência das mesmas mulheres representadas nas letras e nos nomes das bandas de forró pelo estereótipo da “Amélia” ou da “Geni”. Nessas músicas, só existem duas possibilidades de mulher: ou a submissa, em casa, à espera do marido, ou a leviana, promíscua – aquela que, segundo a determinação musical, não merece qualquer respeito.
Não pretendo com isso dizer que todas as mulheres devam ser feministas, mas acredito ser de extrema importância um olhar (e nesse caso, um ouvir) mais crítico em relação aos produtos que consumimos; e, a meu ver, não há sentido ou adequação para a mulher consumir uma música que a desmoraliza, a desumaniza e, algumas vezes, até incita a violência contra ela – como é o caso de algumas letras de forró cujos conteúdos ressaltam a força física do macho alpha diante da fêmea pronta para o próximo ritual de acasalamento.
Veremos o dia?!
Será que veremos o dia em que uma banda de forró se chamará Garoto Safado ou Menino Sem-Vergonha? Será que algum dia haverá letras de músicas de tamanho mau gosto a ponto de agredir os ouvidos dos ouvintes? Enquanto as mulheres não se posicionarem contra esse tipo de agressão verbal estarão fadadas a ouvir músicas como o hit da banda Aviões do Forró, onde se fala de uma mulher “que anda de saia e de bicicletinha, com uma mão no guidom e a outra tapando a calcinha”.
Suzana Martins
É Nati, infelizmente o conteúdo musical que toma conta do nosso país são gêneros que agridem e humilham as mulheres. E o mais estranho de tudo isso é que algumas mulheres cantam e dançam como se a letra dessa música fosse à coisa mais bonita e normal do mundo. As letras são tão pobres, agressivas, mas infelizmente tudo isso se torna popular e de fácil acesso. Acredito que se fosse ao contrário, se as letras musicais agredissem de certa forma o mundo masculino, não venderia tanto. Algumas mulheres se deixam levar pelo ritmo e esquecem, ou deixam passar a letra que a ridiculariza.
Adorei o post, Nati!!
Beijinhos coisinha maranhense da minha vida!!! 😀
Lorena
Primeiro de tudo: saudaaaaaaades desse blog, meu Deus. Vivi um dejá vu (e não estou falando de banda de forró, rs) agora, passando por aqui… Saudades enormes. (E vontade enorme de voltar pra esse mundo 🙁 )Segundo: saudaaaaaaaades da Natis e da Su, e dos textos de vocês, e de ler coisas inteligentes postadas por mulheres inteligentes, que querem e se empenham em fazer a diferença. E por isso mesmo tenho que elogiar, muito e muito e sempre, esse texto da Nati. É bom saber que nós existimos: mulheres que se preocupam com o futuro das mulheres e, consequentemente, com o futuro de um modo geral.
Eu sou feminista e eu não tenho vergonha de admitir isso. E pra mim, ver o quanto a sociedade regrediu de, não sei, 20 anos pra cá em relação ao papel da mulher e, principalmente, sua representatividade na mídia, é sim doloroso. Não imaginei que fosse ser adulta numa sociedade que despreza a mulher inclusive na sua expressão cultural. E pra muitos pode parecer que eu exagero, mas eu acho que não. Quem acha que a cultura não influencia, ou ainda, não é retrato dos valores morais de um povo, precisa refletir muito sobre o seu papel nesse povo, porque pode estar perpetuando o valores deturpados. O machismo é um ranço que a sociedade brasileira está longe de viver sem. Mas houve um tempo em que as mulheres tentaram mudar isso e elas tinham força, porque parecia um querer geral. Hoje eu tenho medo de que sejamos poucas e não suficientes, justamente porque a mulher se acostumou a ser tratada como objeto, a ser denegrida, colabora com essa agreção, é tão agente quanto o homem. E isso me dá um medo danado, sendo bem sincera… Dá medo de que não exista esperança.
Mas tem que existir, não é mesmo?? Nós existimos, mulheres que não aceitam e não se calam. Tenho que acreditar que nós somos a diferença. E eu acredito. 🙂
Belíssimo texto, mais uma vez, Nati! 🙂
Vou tentar voltar a ativa, meninas, nem que seja como leitora. 🙂
Beijos
Francy´s Oliva
Bom dia linda, vc colocou muitissimo bem as palavras sobre as musicas de hoje, confesso não gosto deste genero musical, pois, a letra não agrada aos meus ouvido e cá entre nós sou das antigas gosto de verso e prosa e palavras bonitas que faz bem para a minha alma.
bjs em sua alma.
Du
Sempre achei um tremendo absurdo algumas mulheres se deixarem colocar nessa posição degradantemente musical… não, letras assim não podem ser chamadas de música. Música de verdade é alimento pra alma, coisas assim são alienação e vergonha. Infelizmente tem gente que gosta, que dança e que compra essas barbaridades. E enquanto existir quem goste… pois é.
Excelente texto, parabéns minha querida Natália!
Beijos, Sussu!
Paulo R. Diesel
Tudo por alguns reais. O mundo, infelizmente,é machista e as mulheres não se dão conta do poder que tem. Enquanto isto, não só nas músicas, é isto que relatastes e que a gente vê
Brunno Soares
Realmente é lamentável essa condição que acontece com a figura feminina nas ditas 'músicas' dessas bandas. A maioria das minhas amigas adoram essa porcarias e nem sabem o qnto isso contribui p/ q elas sejam tratadas de qualquer forma pelos homens.
gostei mt do texto. Uma realidade delicada.
Mas que precisa ser mudada.
qnto a vermos a mesma idiotice sendo cantada sobre o homem, acho pouco provável, infelizmente.
bjos
TEREZA FREIRE
Su, Natália conseguiu traduzir em palavras toda indignação de qualquer mulher, no mínimo, consciênte. Não se trata de feminismo, mas de valorização e dignidade da mulher. Sempre me incomodou aqueles comerciais de cachaça ou cerveja que usam a mulher (mais especificamente, seu trazeiro) como atração principal da propaganda aliada ao nome da bebida. Ou comerciais de produtos domésticos onde a mulher aparece como maior interessada, tudo em nome do bem estar do marido e filhos… ela só serve para aplicar o produto. Não entendo como pessoas de um certo nível de esclarecimento (creio eu) se passam para "estrelar" tais comerciais. São essas mulheres que incentivam esse tipo de tratamento. Está mais do que na hora de se acabar com essa visão machista e arcaica. A mulher, apesar de tantas conquistas, ainda se deixa levar por uma vaidade erótica, se deixa seduzir por cantadas baratas ou elogios de "boas maneiras e práticas do lar". Parece que ainda não descobriram a função do cérebro. Esse texto deveria ser amplamente divulgado. Beijos.
manda truco
O Axé e o forró nas suas versoes actuais tao vulgares sao sim degradantes para a mulher, alem de ser de um nivel musical bem por debaixo do cero… Uma verdadeira desgraça para um pais com a tradiçao musical que o Brasil tem. E o mais triste é que tem o seu público (ou as grandes discográficas decidiron que merecem ter). Beijos do outro lado do mar, adorei o seu blog.