Aqui não tem base as Épocas para o Tempo ser passado

Lembro de sentarmos em volta da fogueira, quando o mês de junho despontava no calendário; ficávamos ali horas a fio contando histórias e cantando canções que vinham de outros horizontes. Cantávamos sempre a música que tocava repetidamente no rádio ou aquela moda antiga cheia de notas melancólicas.  Tentávamos acompanhar a poesia das tuas falas, mas nos perdíamos no compasso da tua voz.

A viola ganhava vida em tuas mãos.

Fecho os olhos e ainda consigo ouvir aquela canção noturna. Ouço os acordes tão bem ensaiados… o coração dispara de saudade daqueles momentos em que o tempo não poderia ter passado. Era mágico. Sinto o cheiro da fumaça a misturar com o orvalho da caatinga e o calor do fogo a aquecer lembranças alegres daqueles instantes inesquecíveis. Percepções. Sensações.

A poesia nasceu ali naquelas cantigas entoadas em volta do fogo e tendo a caatinga como testemunha.

O tempo parece perder-se em meus beirais. O teu sorriso parecia infinito…

Mergulho naquelas memórias e não esqueço o detalhe do céu a enfeitar a noite. O luar do sertão é um dos mais bonitos que os meus pequenos olhos já avistaram. A via láctea tão bem desenhada espalhada pelo manto negro bordado de estrelas, completava a poesia sertaneja que tu me ensinaste a amar. O céu parecia dançar a cada melodia entoada pelos acordes da tua viola. As estrelas pareciam acompanhar a tua voz.

O tempo passou depressa e quando voltei, depois de alguns anos, tu não estavas mais. Tinha virado estrela. Gosto de pensar assim… Tu fazias parte da via láctea.

Aqui não tem base as Épocas para o Tempo ser passado.

Hoje, aquela canção noturna tocou no rádio. Lembrei das estrelas, do orvalho da caatinga, do céu do sertão e da tua viola a embalar todas as lembranças nostálgicas de minh’alma. O tempo passa apressado, mas deixa tatuado histórias, canções e todas as dimensões da nossa vida.

Quando a saudade rasga o peito permito-me perder nas memórias do luar do sertão.

Suzana Martins

O céu do sertão a embalar saudades

Projeto Blogvember – Scenarium Livros Artesanais
Título: Emily Dickinson – tradução Jorge de Senna
Participam juntos comigo: Lunna GuedesObdúlio Nunes OrtegaRoseli Pedroso e Mariana Gouveia