Num post com esse título, eu poderia perfeitamente falar da minha casa, que pelo tamanho pode ser considerada uma casa de boneca, ou uma caixa de fósforo, como eu prefiro carinhosamente chamá-la. Mas a intenção não é falar da minha casa, e sim da casa de boneca que eu nunca tive.
Minha sempre disse que eu tive tudo que quis, menos pira (pira significa sarna). Mas ela nunca me deu uma casa de boneca daquelas bem grandes que as meninas mais chatas (e com dinheiro pra comprar) tinham. As casas de boneca das meninas chatas não eram pra brincar, eram só pra ver. Na verdade, eram para que elas, desde pequenas, praticassem a ostentação, a arte de ter algo para exibição, e não para deleite próprio ou de outrem, caso a generosidade lhes permita.
Pensando bem, acho que eu nunca pedi essa casa de boneca pra minha mãe. Logo, ela nunca teria como adivinhar a minha cobiça pela casa (de boneca) alheia.
Não sei se por causa disso, mas eu acabei desgostando das bonecas e enveredando pelo ramo dos brinquedos eletrônicos, sobretudo as maquininhas de fazer qualquer coisa. Era máquina de sorverte, máquina de costura, pipoqueira, máquina de tricô…
Em falar da máquina de tricô, devo uma das minhas grandes frustrações infantis a ela, a máquina que mamãe me deu achando que eu ia amar. E amei mesmo, execeto pelo fato de que eu nunca consegui tricotar nada com ela. Me restava apenas olhar a embalagem onde as meninas felizes usavam seus gorros e cachecóis tricotados pela “máquina”. Sorte minha que moro em cidade quente. Do contrário, teria congelado diante do infantil fracasso. Nessa época eu ainda não entendia que cada pessoa tem habilidade pra uma coisa e durante algum tempo insisti nas artes manuais. Acabei aprendendo ponto cruz com a minha vó, me tornei uma pequena “bordadeira” nos muitos fins-de-semana que eu passava com a vovó.
Quanto aos brinquedos, era só ter pilha e acender umas luzinhas que eu adorava. Se falasse e contasse piadas sarcásticas, eu gostava ainda mais. Difícil era encontrar brinquedo que fizesse isso, ainda mais entre os recomendados para a idade.
Hoje sei que mamãe teria gastado dinheiro em vão me comprando aquela casinha (?) de boneca. Eu realmente não gostava de bonecas. A fase de Barbie foi apenas uma fase. Meu negócio era mesmo ser uma criança nerd, que chegava mais cedo na escola pra ficar na biblioteca, sentava na primeira carteira e recebia cheeeia de mim os 1001 elogios da professora à minha pessoa.
Da época de criança nerd não sobraram traumas. Ser nerd até que era bem legal. E a minha frustração maior não foi descobrir prematuramente que meus netos nunca terão casaquinhos tricotados pela vovó, e sim nunca ter podido cozinhar no mini-microondas com o qual eu sonhava todos os dias. Devo ter pedido esse mini-microondas, que cozinhava de verdade, uns dois Natais seguidos, mas papai, um nerd inrustido, sempre alegava que o brinquedo emitia ondas radioativas extremamente prejudiciais a uma criança da minha idade. Como rastro, a nerdisse deixou o gosto pela leitura. E graças a Deus, ainda não inventaram o livro radioativo.
[10.12.2007]