E mil orações aos céus para a vida apagar de uma vez

Apaguei a luz
no sussurro
da minha voz perdida
no auge do meu pecado
na busca infinita da minha falha
na certeza
dos movimentos coagulados.

A minha fala cultua a matéria oculta
o átomo impiedoso
o silêncio inabalável
rabiscado na borda da página.

Refiz os meus silêncios
na solidão castigada
da minha prece perdida
na linguagem sólida
da palavra profana
na oração inacabada
do meu clamor mudo.

A minha sentença
é um provérbio aceso
a cultuar o verbo carne
imperfeito ser
a rasgar o terço de minhas súplicas.

Quebrei a lâmpada
apaguei a vela
joguei fora as escrituras
não recebi o perdão.

Louváveis são as minhas rezas
hereges
a parafrasear o sermão da montanha
a encarar as falas paroxítonas
do meu ser.

Apaguei a luz
rasguei todas as palavras
sacrossantas
hipócritas
revelei a fissura da página aguda
desfiz a quietude da oração perfeita.
Morri na fragilidade
das minhas falas
monossilábicas
ressuscitei no detalhe
exposto da minha prece
e na nudez disfarçada de poesia.

Suzana Martins

Projeto Blogvember – Scenarium Livros Artesanais
Título do post: Flávia Côrtes, As Estações
Participam juntos comigo: Lunna Guedes – Obdúlio Nunes Ortega – Roseli Pedroso e Mariana Gouveia