para não findar o sentir

Morri ontem
nas areias geladas
daquela praia
vazia
oca
insípida.
Morri na extremidade
da onda
a explodir na praia.

Deserta, apaguei
traços de mim
que foram esquecidos
no expandir
das incertezas absolutas.

Morri ontem
na hesitação do poema
pálida
selvagem
pequena
largada
incerta
abandonada na proa
esquecida
na imensidão sufocante
do oceano
com uma flâmula na mão
a pedir socorro.

O sol apagou
as cores das nuvens
que enfeitavam o céu
e com os olhos sangrando
afoguei-me nas lágrimas
salgadas
que escorriam
da retina escura
opaca
do olhar ermo
deserto da
minha alma insone.

Morri hoje
na metade da palavra
na conjugação imperfeita
no meio do sentir inócuo
arrancado e mim.

Morri no agora
no verso pulsante
na flor em pétala
na epopeia vazia
no ecoar da página
no lamento intenso da chuva
no verbo-carne Morri na fala deserta
na areia
no mar
nas ondas…

Morri
apagada…

Despertei
na origem da vida
na extremidade da terra
no pulsar do universo
e no ecoar da página infinita
com o sal a expandir o ciclo da vida.