O meu olhar elegeu-te entre os demais num embalo da melodia de um tango antigo escutado entre paredes de vermelho velho. Não havia palavras naquela noite, apenas corpos que se uniam e falavam através da alma. Olhos nos olhos! Pernas que se entrelaçavam como um laço, uma fita… a expressão estava no desejo, no olhar, nos lábios, no molejo.
Os seus passos encantadores me desafiavam. Éramos um só, envoltos na sedução musical. Os acordes eram tocados em tons escarlates, num ritmo tão apaixonado que era impossível resistir-te. União de almas, desejo oculto! Os teus olhos estão fixos aos meus, a sua alma desejava-me. Embalados pela música rodeavas-me num movimento único, numa dança de entrega…
Deslizavas sobre mim o teu corpo, e insinuava-se de modo provocante, erótico até. Eu também queria te conduzir, sentir que estavas no poder de controlar o teu corpo… mas era você quem comandava. De passo em passo, escolhestes o sentido e a direção que tão bem conheces e que me prenderam a ti.
As vozes continuavam mudas, só os corpos falavam… E esta dança há muito tempo que deixou de ser só isso: passos! É um querer por inteiro, é uma vontade de ceder aos seus anseios mais íntimos…  Seus desejos que se sobrepõe aos meus. O meu corpo obedece-te e entrega-se ao teu de uma forma cega. Denuncio-te mais do que aquilo que gostaria que soubesses. Nada mais posso fazer, pois a dança é a linguagem oculta da alma…
Conheces-me, assim, entre passos decididos e uma entrega definida pelo toque. Ao final da música e a cada nota que se sucede vamos possuindo passos pouco explorados um do outro a um ritmo alucinante. A música termina e com ela o fim do nosso encontro sem que tenhamos aproximado os nossos lábios.