Portas fechadas e livros abertos
Houve um tempo em que uma certa Sofia navegava por aqui…
(Pintura: ©Iman Maleki)
Ela era tímida, de poucos amigos e andava sempre com um caderno em mãos. De pele clara, estatura mediana, cabelos na altura do ombro, tinha sua beleza particular, mas não era uma pessoa que chamava a atenção dos rapazes da sua idade. Havia um mistério em seu andar que muitos deles queriam descobrir, porém não conseguiam. Ela tinha o olhar distante e fazia questão de escondê-los sob as lentes dos óculos quadrados que usava. Era conhecida como a “moça dos livros”.
“Ah! É aquela moça que vive a sombra das árvores lendo palavras de uma tal Cecília, Clarice, Mário de Andrade e tantos outras Pessoas, que um dia, escreveram em letras nostálgicas.” – era o que diziam sobre ela.
Sofia era feliz, mas ninguém sabia. Ela demonstrava sorrisos somente quando abria o seu mundo de palavras encantadas lendo e escrevendo até o amanhecer. Não gostava de poesias, mas rimava versos rabiscados em contos que encontrava no meio do caminho. Escrevia numa contradição poética que nenhuma escola literária encaixa em seus rascunhos. Sofia era menina pelo avesso numa curiosidade a portas fechadas.
Houve uma época em que ela caminhava todos os dias, às cinco horas da tarde, por uma rua de prédios antigos. Era uma arquitetura meio rústica e ao mesmo tempo contemporânea que a encantava num palavrear mudo. Ela gostava das histórias que aquelas fachadas contavam. Na verdade, ela gostava de criar histórias coloridas para cada porta e janela ali desenhada.
Porém, havia um prédio, no estilo colonial, que nunca se abria. No alto dele, em letras quebradas, parecia haver algo escrito, mas ela nunca conseguiu unir as palavras dispersas. Sofia entristecia tudo isso, porque ela queria interpretar aquela história contada há tanto tempo e não conseguia encontrar o fim daquelas letras. Foram longos dias caminhando por aquela rua arcaica sem saber os mistérios do tal prédio apagado. Não desistiu, no entanto, parou de andar por ali. Queria esquecer os passos cansados em composições sem pressa.
Certo dia, longe de sua rotina, passou novamente por aquela rua e para sua surpresa a porta estava aberta. Seus olhos não acreditavam no que via. E assim, ela, em sua pressa ansiosa entrou sem ao menos contar os passos que pediam silêncio. O lugar escrevia quietude, porém dentro dela, havia uma euforia de carnaval que ultrapassava a sua derme num barulho rascunhado de emoções. Alegorias enfeitavam o seu sorriso num descompasso de expressões que só ela mesma era capaz de entender.
O letreiro da fachada fora descoberto. Ela estava numa biblioteca.
Os olhos de Sofia brilhavam dentro dos seus óculos quadrados, e ela, finalmente, poderia reescrever cada verso que estava apagado. Conteve os passos, as letras num medo de perceber a sua presença. Ela agora estava ali, não precisava de pressa, queria apenas o silêncio das folhas e o barulho das letras em sua derme. Esqueceu-se no tempo. Ela, lentamente tocava todos aqueles exemplares escondidos na estante, era como se estivesse acariciando as histórias narradas por aqueles autores que contavam sentimentos em almas.
Tocou em todos, um a um, com os olhos e com as mãos, mas principalmente, com o olfato. Não havia mais mistérios naquelas portas fechadas. Ali, existiam livros de histórias bem narradas e algumas lágrimas derramadas. Sofia esqueceu o tempo e delicadamente conhecia os contos que suas letras rimavam. Leu Mário, Cecília e guardou Clarice numa alma de versos pelo avesso, reescrevendo em letras miúdas sentimentos de um tal Machado.
Ela era assim: feliz ao seu tempo, na sua pressa e na sua calma. Sofia se esqueceu em livros e se trancou, mais uma vez, em seu mistério de portas fechadas e livros abertos.
Gisa
Linda Sofia e seus mistérios.
Um grande bj
RosaMaria
Ahhh Sofia!
Adoro este nome.
Amei a imagem, bom gosto como sempre.
Todas nós somos um tanto Sofia, por medo do passo seguinte ou do sentimento dolorido nos trancamos em livros.
Um beijo!
Se cuida.
Celso Mendes
"e se trancou, mais uma vez, em seu mistério de portas fechadas e livros abertos."
Que fecho lindo para uma crônica tocante… Muito belo mesmo.
Beijo.
ROSANA VENTURA
QUE LINDOOOOOOOOOO!
bjossss
OceanoAzul.Sonhos
Delicioso de se ler.
um abraço amiga
oa.s
Suzana Martins
Obrigada Gisa
Beijos
Suzana Martins
Muito obrigada Linda Rosa!!
É sim, somos um pouco Sofia entre mistério, palavras, letras, livros e sentimentos…
Beijos e beijos no seu coração linda!!
Suzana Martins
Vc tem um olhar incrível Celso!!
A sensibilidade das palavras reunidas em versos e olhares…
Beijos querido
Suzana Martins
Obrigada Rosana!!
Beijos
Suzana Martins
OA.S
Beijos minha amiga sempre carinhosa!!
Jorge Pimenta
a tua escrita envolve a cada movimento de olhos. no final, um sempre doce recomeçar.
beijinho!
Suzana Martins
As suas palavras envolventes me emocionam diariamente. É um repensar de versos fáceis…
Recomecemos sempre em palavras…
Beijos querido…